Granito Boneli

MP para controle das relações de trabalho em decorrência do COVID-19

PRINCIPAIS ASPECTOS DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 927, 22/03/2020

Trata-se das alternativas trabalhistas para enfrentamento das questões relacionadas a calamidade pública, em decorrência do coronavírus (COVID-19), para controle das relações de trabalho.

A MP entrou em vigor na data da sua publicação, ou seja, no dia 22/03/2020.

A MP reforça o enquadramento das regras aplicáveis como força maior, observando-se o artigo 501 da CLT, para enfrentamento do estado de calamidade pública decorrente do coronavírus. Nessa ocasião poderão ser celebrados acordos escritos entre empregado e empregador, deixando de lado a participação do sindicato, que prevalecerá sobre os instrumentos normativos, legais e negociais, respeitando-se a Constituição Federal.

Essa MP será objeto de muitas discussões, bem como de ações de controle de constitucionalidade. Porém, como trata-se de situação excepcional, medidas foram tomadas para controle e para regulamentar as relações de trabalho.

TELETRABALHO, OU TRABALHO REMOTO

O artigo 4º da MP prevê que o empregador, A SEU CRITÉRIO, poderá alterar o regime de trabalho para teletrabalho, ou trabalho remoto, independentemente da existência de acordos individuais e coletivos, dispensado o registro prévio da alteração em contrato de trabalho. Portanto, dispensa-se o aditivo contratual.

Lembrando que o artigo 468 da CLT estabelece que, para o contrato ser licitamente alterado, é necessário acordo entre as partes; ou seja, do consentimento do empregado e não pode ter prejuízo ao empregado, aplicando-se assim o artigo 9º da CLT. Lembrando que, nesse momento, o artigo 501 da CLT está sendo aplicado, já que este é utilizado para as situações de força maior.

A MP prevê que o trabalhador deva ser informado com antecedência mínima de 48 horas da referida alteração.

Direitos e deveres referentes a estrutura, notebook, internet e despesas serão definidas em contrato escrito.

Não será considerado tempo à disposição, regime de prontidão ou sobreaviso, o tempo de uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada de trabalho normal. Nesse período de utilização de regras excepcionais para enfrentamento do coronavírus, esse ponto provavelmente será tema de discussões futuras.

FÉRIAS INDIVIDUAIS ANTECIPADAS

Quanto à concessão de FÉRIAS, verifica-se a previsão no artigo 6º da medida provisória; poderão ser antecipadas, devendo ser informadas com antecedência de 48 horas, por escrito, ou por meios eletrônicos, e não poderão ser gozadas em período inferior a cinco dias corridos, bem como poderão ser concedidas, ainda que o período aquisitivo não tenha transcorrido, diante da situação atípica vivida pelo país.

Além disso, pode-se negociar as férias mediante acordo individual escrito.

No mais, o empregador poderá optar por efetuar o pagamento do adicional de um terço após sua concessão, até a data em que é devida a gratificação natalina (13º salário).

O pagamento das férias poderá ser feito até o quinto dia útil do mês subsequente ao início do gozo das férias.

Se houver rescisão do contrato de trabalho, os valores das férias não adimplidos serão pagos junto com as verbas rescisórias.

FÉRIAS COLETIVAS

No artigo 11, prevê-se a possibilidade de o empregador conceder férias coletivas a todos os empregados, ao setor ou a parte de empregados, sendo os trabalhadores informados com 48 horas de antecedência, e fica dispensada a comunicação prévia ao Ministério da Economia e sindicatos.

ANTECIPAÇÃO DOS FERIADOS

O artigo 13 da MP possibilita a antecipação dos feriados não religiosos, nos quais os empregados deverão ser notificados por escrito, ou por meio eletrônico, no prazo de 48 horas de antecedência, com indicação das datas dos feriados que estão sendo antecipados. Dispensa-se a participação do sindicato, podendo ser feito mediante acordo individual.

BANCO DE HORAS

O artigo 14 da MP autoriza a instituição ao regime de banco de horas de compensação de jornada, mediante acordo coletivo ou acordo individual formal.

A compensação poderá ocorrer pelo período de dezoito meses, contando-se do encerramento do estado de calamidade pública. Esta compensação poderá ser determinada pelo empregador independentemente de convenção ou acordo coletivo ou individual.

Assim, quanto ao banco de horas negativo, resta autorizada pela Medida Provisória.

A compensação poderá ser feita mediante prorrogação de jornada em até duas horas, não excedendo dez horas por dia.

SUSPENSÃO DA REALIZAÇÃO DE EXAMES RELACIONADOS A SEGURANÇA E SAÚDE DO TRABALHO

O artigo 15 prevê a suspensão dos exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares, exceto os demissionais; estes poderão ser dispensados se o trabalhador tiver realizado exame ocupacional em prazo menor que 180 dias. Os exames serão retomados no prazo de 60 dias após o encerramento do estado de calamidade.

Em exames que representarem risco à saúde do empregado, o médico indicará ao trabalhador a necessidade de sua realização.

SUSPENSÃO DO CONTRATO DE TRABALHO

O artigo 18 veio estabelecendo a possibilidade da suspensão do contrato de trabalho pelo prazo de até quatro meses. Ocorre que esse artigo já foi revogado pelo Presidente da República por meio do Twitter, no dia 23/03/2020.

Observa-se que uma Medida Provisória somente pode ser revogada por outra Medida Provisória, e provavelmente essa nova Medida Provisória – ou seja, uma edição extraordinária – deverá sair no Diário Oficial. Assim, as duas medidas provisórias irão para o congresso, e este, por sua vez, poderá aprovar as duas, apenas uma delas ou nenhuma delas.

RECOLHIMENTO DO FGTS

Desde já, verifica-se que não há previsão de isenção nem abatimento. Assim, o artigo 19 prevê a suspensão da exigibilidade do recolhimento do FGTS pelos empregadores, referente aos meses de março, abril e maio de 2020, com vencimento nos meses de abril, maio de junho de 2020. Trata-se de um fôlego financeiro concedido às empresas.

O recolhimento dos meses referidos poderá ser realizado de forma parcelada, sem incidência de atualização da multa e dos encargos previstos na Lei do Fundo de Garantia. Poderá ser parcelado em seis vezes, para isso o empregador deve declarar que assumirá a dívida até 20/06/2020; ou seja, o empregador tem que confessar a dívida, e os valores não declarados serão considerados em atraso, havendo aplicação de multa e encargos. O não pagamento das parcelas implicará multa e encargos da Lei do FGTS, bem como ensejará o bloqueio do certificado de regularidade do FGTS.

Fica suspensa a contagem do prazo prescricional dos débitos relativos a contribuições do FGTS pelo prazo de cento e vinte dias, contados da data de entrada em vigor da Medida Provisória.

No caso de rescisão do contrato de trabalho, o empregador fica obrigado ao recolhimento dos valores correspondentes ao FGTS do contrato de trabalho do empregado, isso se feitos dentro do prazo; caso contrário, serão aplicados multa e encargos previstos na Lei do FGTS (TR).

OUTRAS DISPOSIÇÕES DA MEDIDA PROVISÓRIA

O artigo 26 permite prorrogar a jornada de trabalho e adotar escalas de horas suplementares sem que haja penalidade administrativa; para atividades insalubres, jornada de doze horas de trabalho por trinta e seis de descanso. As horas suplementares poderão ser compensadas no prazo de 18 meses, contados do encerramento da calamidade pública, por meio de banco de horas ou remuneradas como horas extras.

Portanto, prevê-se que pode prorrogar jornada aplicando o artigo 61 da CLT – visto que no parágrafo 3º da CLT está previsto que, em caso de necessidade imperiosa, força maior, ao final dessa interrupção do contrato de trabalho o empregado poderá fazer duas horas extras por dia durante o período de 45 dias no máximo, por ano; ele poderá compensar 90 horas posteriormente, independente de acordo ou convenção coletiva de trabalho.

Um dos pontos mais importantes é verificado na previsão do artigo 29, estabelecendo que os casos de contaminação pelo coronavírus (COVID-19) não serão considerados ocupacionais, exceto mediante comprovação do nexo causal. Vale lembrar que, no caso de doença ocupacional, a regra é que os 15 primeiros dias de afastamento são pagos pela empresa e, depois do 16º dia, o INSS paga o benefício previdenciário (auxílio-doença). Aqui, a MP diz que não se trata de doença ocupacional; portanto, o INSS não irá pagar e, assim, nessa situação de isolamento, são consideradas faltas justificadas e o empregador terá que pagar os dias de afastamento/licença remunerada.

Além disso, quanto ao artigo 30, acordos e convenções coletivos vencidos ou vincendos no prazo de cento e oitenta dias – contados da data de entrada em vigor da Medida Provisória –, poderão ser prorrogados a critério do empregador, pelo prazo de noventa dias após o termo final deste prazo.

A MP ainda estabelece que se aplicam a trabalho temporário e a empregados domésticos previsões tais como jornada, banco de horas e férias.

Estas previsões não se aplicam aos trabalhadores em regime de teletrabalho, teleatendimento e telemarketing, que exigem uma regulamentação especial.

Por fim, consideram-se validadas as medidas trabalhistas adotadas por empregadores que não contrariem o disposto na Medida Provisória, tomadas no período dos trinta dias anteriores à data de entrada em vigor da referida Medida Provisória.

(Por Dra. Adriana Breganholi, em 23/03/2020 – advogada especialista em Direito do Trabalho, Coordenadora do escritório GCBA Advogados Associados)