Segundo análise do projeto Transforma, pela forma como a equipe econômica apresentou a ideia, medida pode gerar efeitos adversos nas contas públicas e no combate à desigualdade.
A ampliação da isenção do imposto de renda de pessoa física para quem ganha até R$ 5 mil pode beneficiar também os mais ricos e piorar a posição do Brasil no Índice de Gini em até 1,1 ponto percentual, segundo uma pesquisa do Transforma, projeto do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A proposta de isenção foi apres
De acordo com Ricardo Gonçalves, analista técnico do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) e responsável pela análise na Unicamp, pela maneira como a equipe econômica apresentou a ideia e com as informações disponíveis até o momento, a medida pode gerar efeitos adversos tanto paras as contas públicas quanto para o combate à desigualdade social no país.
“Se só aumentar a faixa de isenção, sem mudar as alíquotas, acaba dando um alívio tributário para todos, inclusive os mais ricos, porque a cobrança do imposto de renda é feita marginalmente. Mesmo a pessoa que ganha R$ 10 mil, por exemplo, até R$ 5 mil, a renda dele vai ser isenta. Portanto, toda a população vai ter um alívio tributário”, explica Gonçalves.
Para ele, que é doutorando em teoria econômica pela Unicamp, isentar salários mensais de até R$ 5 mil não é uma medida ruim em si, pois poderia ser mais um motor de crescimento via demanda. Mas, sem uma tabela de alíquota progressiva, é praticamente certo que a desigualdade aumentaria.
No estudo, Gonçalves indica que, após a atualização da faixa de isenção de R$2.640 para R$ 2.824 em 2024, o impacto na distribuição de renda, medida pelo Índice de Gini, já piorou em 0,1 pontos percentuais. Portanto, seguindo o mesmo modelo, com a atual proposta de isentar até R$ 5 mil, o impacto negativo seria de 1,1 pontos percentuais.
“Via de regra, quando se aumentam faixas de isenção sem mudar a tabela progressiva, sempre há um efeito concentrador de renda. Muita gente acha que isso é contraintuitivo porque a medida é pensada para favorecer os mais pobres. Mas, como todo mundo tem o alívio tributário, acaba gerando um efeito concentrador”, acrescenta Gonçalves. “Em termos de desigualdade, se quiser evitar que aumente, tem que mexer na tabela progressiva para conseguir manter o impacto distributivo imaginado”.
Em relação à proposta de criação de uma nova alíquota de 10% para quem ganha acima de R$ 50 mil por mês, Gonçalves acredita que não seria suficiente para evitar um aumento da desigualdade social, mesmo que compense a perda de arrecadação, como foi anunciado pelo ministro Fernando Haddad.
Para o economista da Unicamp, a margem entre R$ 5 mil e R$ 50 mil que não ficaria sujeita a uma tabela progressiva está muito grande. “Se isentar até R$ 5 mil, tem que aplicar alíquotas mais altas, progressivamente, de quem ganha até R$ 50 mil. E seria importante também tributar lucros e dividendos de forma progressiva”.
Por outro lado, Gonçalves reflete que, ao contrário de países desenvolvidos onde a tributação chega a 45% para salários mensais equivalentes a R$ 15 mil, os serviços públicos no Brasil deixam a desejar, o que faz com que as pessoas desse nível de renda comprometam boa parte dos seus ganhos com gastos em saúde, segurança e educação para os filhos.
“Embora essas pessoas estejam numa parcela dos 1% mais ricos do país, realmente, na realidade brasileira, não podemos considerar que quem ganha R$ 20 mil, por exemplo, já é uma pessoa super-rica. A reforma tributária da renda precisa considerar essa desigualdade incrível dentro dessa parcela de 1%. Na criação de uma tabela progressiva, isso também precisa ser observado”, afirma Gonçalves.